I
De acordo com dados recentes, cerca de 2300 mulheres são mortas todos os anos na Europa pelos seus companheiros ou ex-companheiros. Ou seja, 45 mulheres são mortas todas as semanas. Em Portugal, só este ano foram violadas 38 mulheres por mês e até ao final de setembro registaram-se 15 homicídios e mais de 7 mil queixas por violência doméstica. Também nos Açores, a violência doméstica é uma chaga social cujo combate devia, desde logo, assumir caráter prioritário, com a prevenção a iniciar-se a partir do pré-escolar. Nenhuma sociedade evoluída pode aceitar ou sequer conformar-se com quaisquer índices de violência doméstica.
No passado dia 25 de novembro, assinalou-se o Dia Internacional do Combate à violência contra as mulheres. Ao contrário de muitas outras datas evocativas, este é um dia cujo propósito final deve, acima de tudo, ser que passe a deixar de existir.
II
Nada ilustra melhor o modo como o Governo Regional pratica uma liderança assente na máxima de ser “forte com os fracos e fraco com os fortes”, do que a teimosa insistência em discriminar as crianças filhas de pais desempregados no acesso às creches. Esta decisão que, recorde-se, na Assembleia da República foi chumbada, encontrou respaldo na coligação que governa os Açores. É impressionante a empáfia e o manifesto desprezo pelo princípio da igualdade subjacentes a esta proposta. Ao aceitar essa proposta do Chega, sem sequer pestanejar ou qualquer outro assomo de consciência, o governo da coligação ofende os mais básicos princípios social democratas. Que não o perceba, é um problema do PSD que, aos poucos, vai sendo “canibalizado” pelo Chega, à semelhança do que tem sucedido com as restantes famílias políticas conservadoras por todo o lado, incapazes de reagir e de fazer face à horda populista.
III
A semana que passou ficou marcada pela eleição, no Parlamento Europeu, do novo colégio de comissários. Um processo longo, com vários avanços e recuos, que não prestigiaram a instituição parlamentar. Em primeiro lugar, as audições aos Comissários assentaram num modelo que, na prática, não favorece um escrutínio muito rigoroso. Sabemos que todos os Estados-Membros têm o direito de indicar um candidato. Mas, atribuir uma vice-presidência crítica a um representante da direita radical, entregar pastas decisivas a quem demonstra indiferença pelos direitos básicos (como é o caso dos direitos reprodutivos e o direito das mulheres) constitui uma escolha política da Presidente da Comissão Europeia. Ainda assim, apesar destes e de outros indicadores negativos, votei favoravelmente o colégio de comissários. Fi-lo porque acredito que os riscos e ameaças que confrontam o projeto europeu seriam muito maiores se, pelo contrário, a UE ficasse sem uma Comissão em efetividade de funções. Demos o benefício da dúvida a esta Comissão Europeia, mas como a parca taxa de aprovação comprova e a direita e Von der Leyen devem saber, não demos um cheque em branco. Veremos que caminho seguirá no mandato que agora começa.
IV
Ainda esta semana e a propósito do dia 25 de Novembro, dei por mim a pensar na célebre frase do filósofo e estadista irlandês Edmund Burke. “Para que o mal triunfe, basta que os bons fiquem de braços cruzados”. Felizmente, nesse dia há 49 anos, o PS liderado por Mário Soares e um conjunto de corajosos militares não ficaram de braços cruzados. Pena é que os herdeiros dos derrotados do 25 de Abril queiram, com a cumplicidade de alguns, reescrever a história e fazer do 25 de Novembro aquilo que manifestamente não foi: um ajuste de contas com Abril. Também aqui convém não ficar de braços cruzados.